Nascido no dia de 7 de junho de 1902, no Rio de Janeiro, filho de imigrantes italianos, Roberto Morena tornou-se entalhador de imóveis e em seu primeiro emprego aderiu ao sindicato. Por ser um dos raros operários alfabetizados de seu ramo, Morena tornou-se de imediato secretário do sindicato. Anarquista desde os bancos escolares, defendeu as suas posições políticas até 1924, quando, aderindo à corrente liderada por Astrojildo Pereira, ingressou no PCB, tornando-se um “profissional da revolução”.
Em 1929, com a formação da Confederação Geral do Trabalho, Morena, que já era secretário da Federação Sindical Regional do Rio de Janeiro, foi eleito para o mesmo posto na nova organização. Como tal, foi designado delegado à conferência que, sob a iniciativa da Internacional Sindical Vermelha, reuniu-se em Montevidéu, em maio de 1929, para constituir a Confederação Sindical Latino-Americana.
Em 1932, devido ao seu envolvimento na direção da greve geral de São Paulo, ficou preso por vários meses em Ilha Grande, juntamente com a maior parte da direção regional do PCB. De lá saiu para logo ser condenado ao exílio forçado no Uruguai, onde permaneceu por mais de um ano.
Após a insurreição de 1935, Morena deslocou-se do Rio Grande do Sul, onde tinha entrado clandestinamente, para o Rio de Janeiro, a fim de salvar o que restava do aparelho partidário. Novamente foi preso e passou um ano na Casa de Detenção. Em junho de 1937, foi libertado junto com outros presos políticos por decisão do Ministro da Justiça Macedo
Soares, no episódio conhecido como “macedada”. No final de outubro, atendendo ao apelo do Komintern (Internacional Comunista) para prestar solidariedade à República Espanhola, Morena viajou clandestinamente para a Europa, após ele mesmo ter mobilizado e enviado um certo número de companheiros militares à Espanha. Um dos poucos voluntários brasileiros a não dispor de formação militar, Morena foi designado, inicialmente, comissário político de uma das unidades do Batalhão Garibaldi, das Brigadas Internacionais, e depois integrou estruturas administrativas controladas pelo PCB na região de Alicante. Mas os golpes combinados entre os fascismos franquista, hitlerista e mussolinista se revelaram mais poderosos do que o esforço de solidariedade internacionalista de soviéticos e democratas ocidentais. Os brasileiros participaram da defesa da República até os seus momentos finais. Morena foi um dos últimos a embarcarem no vapor Stanbrook, enviado a Alicante para recolher os militares políticos e sindicais mais comprometidos com a causa antifascista. O navio aportou em Oran, na então Argélia francesa, onde os refugiados foram enviados, imediatamente, a campos de concentração no interior do país. Após duas ou três rocambolescas tentativas de fuga, Morena conseguiu escapar e viajou para a União Soviética.
Entre a internação em um hospital de Moscou e o trabalho voluntário em uma fábrica de tratores na cidade de Tcheliabinsk, Morena passou 18 meses na pátria do socialismo.
Antes do envolvimento da União Soviética na Segunda Guerra Mundial, Morena retornou ao Brasil, passando por Vladivostok, Japão, México, Valparaíso e Buenos Aires. No Brasil, desenvolveu um trabalho de reorganização partidária e de “união naciona, até ser preso em 1942 e enviado para Ilha Grande, onde cumpriu um ano de cadeia.
No período que vai de sua saída da prisão, em março de 1943, à anistia política e legalização do PCB, em abril de 1945, Morena alternou seu trabalho profissional de marceneiro e sua atividade clandestina de militante político com diversas e curtas passagens pela prisão, simples permanências de controle e verificação cada vez que a polícia do Sr. Filinto Müller desejava retirar os comunistas de circulação. Morena participou ativamente na reconstrução de diversos sindicatos da região do Rio de Janeiro, ajudando na formação do Movimento Unitário dos Trabalhadores.
Ainda nesse período, casou-se Maria Eugênia Frascari. O fruto dessa união – único, pois Morena passaria a maior parte do tempo clandestino ou fugindo da polícia – receberia o nome indisfarçável de Carlos Frederico.
Diante das eleições parlamentares de 1950, Morena representava uma das poucas garantias de um mandato seguro, razão pela qual foi chamado às pressas do México e colocado nas listas do Partido Republicano Trabalhista (o PCB estava na ilegalidade naquela época) para concorrer ao cargo de deputado federal pelo antigo Distrito Federal.
O ponto alto de sua atuação legislativa foi a luta contra o acordo militar Brasil – Estados Unidos e pela preservação das riquezas do país (petróleo, Amazônia), que lhe valeu a admiração e o respeito inclusive de parlamentares liberal-burgueses , como Afonso Arinos, ou claramente conservadores, como o nacionalista Arthur Bernardes. O ferrenho anticomunista José Bonifácio de Andrada chegaria mesmo a dizer que “Morena sozinho, valia por toda uma bancada”. Tanto os seus companheiros como os seus adversários políticos admiravam a coerência, a cultura e a erudição do deputado proletário, profundo conhecedor de música, teatro, cinema e literatura, com uma enorme capacidade de se expressar e transmitir suas idéias e que, apesar de só ter formação escolar básica, dominava perfeitamente quatro idiomas.
Morena, com seu comportamento amplo, insistia em afirmar que, em todo ser humano, por maiores que sejam os seus defeitos, há sempre um percentual mínimo que pode ser aproveitado.
Um “realista romântico”, com grande dose de socialismo humanista, Morena era, no entanto, o oposto de um sonhador e voluntarista: para ele, a ação organizada dos trabalhadores deveria passar, necessariamentem, por um forte partido político de classe, principal razão de sua recusa em aderir a pequenos grupos que se propunham fundar o “verdadeiro partido do proletariado”.
No período entre o governo Kubitschek e o golpe de 64, Morena exerceu um papel de destaque na condução das lutas operárias e atividades sindicais. Ele esteve presente nas etapas principais do desenvolvimento sindical unitário, como o COPS (Comissão Permanente das Organizações Sindicais), que congregava os sindicatos mais importantes do Rio de Janeiro; o Terceiro Congresso Sindical Nacional em 1960, onde ajudou a preparar o terreno para a expulsão dos pelegos da CNTI; a CGG (Comando Geral de Greve), saído da famosa “ greve da paridade” no governo Quadros e o CGT (Comando Geral dos Trabalhadores). Vale assinalar, ainda, seu trabalho – quase burocrático – na estrutura previdenciária anterior a 64, na qualidade de conselheiro apontado pelos sindicatos e, no
mesmo período, seu esforço – mais uma marca do seu internacionalismo – em prol da constituição de uma Central Única de Trabalhadores da América Latina. Essa fase também foi caracterizada por diversas viagens pelos países da América Latina, ajudando inclusive a organizar e reorganizar os partidos comunistas locais.
Com o golpe militar e o fracasso do famoso “dispositivo sindical” janguista, Morena, depois de tentar em vão articular uma improvável greve geral, partiu para o exílio no Chile, onde se tornou secretário do Congresso Permanente de Unidade Sindical dos Trabalhadores da América Latina (CPUSTAL). Mesmo condenado a sete anos de prisão nos diversos processos montados contra ele, voltou ao Brasil três anos depois para tomar parte, como delegado, no VI Congresso do PCB realizado clandestinamente em princípios de 1967. Ali, Morena foi eleito para o Comitê Central do Partido.
Ao ser expulso do Chile, em princípios de 1968, Morena passou a representar informalmente o Brasil na sede da Federação Sindical Mundial, em Praga.
Passaria a maior parte de seus últimos anos de vida voltado para a organização de um meticuloso arquivo pessoal e viajando, quando as circunstâncias permitiam, para a Europa Ocidental, tendo participado em 1977 do famoso Tribunal Bertrand Russel.
Combalido pelo câncer, tentou reunir forças para voltar ao Brasil, no que seria seu último gesto político. A doença que lhe minava o corpo, porém, foi mais rápida do que a vitória da anistia no Brasil e Morena faleceu em Praga em 5 de setembro de 1978. Finalmente, em junho de 1980, por gestões de sindicalistas e companheiros de Partido, suas cinzas foram transladadas para um cemitério do seu querido Rio de Janeiro, a cidade que ele esperava poder voltar a ver.