Milton Pinheiro[1]
Recentemente uma equipe do ministério público federal descobriu, na casa do tenente-coronel Paulo Malhães, documentos e relatórios de uma operação do Centro de Informações do Exército (CIE) para perseguir militantes políticos nas fronteiras do sul do Brasil.
Esse material, da “Operação gringo”, data de 31 de dezembro de 1979 e traz algo que reitera uma antiga prática dos governos militares: a destruição do PCB como “inimigo” a ser mais uma vez combatido diante da perspectiva da transição política da ditadura para a democracia tutelada e, ao mesmo tempo, a justificativa para manter os aparelhos de repressão.
A historiografia já confirmou, com farta documentação, que o PCB, mesmo não fazendo o enfrentamento armado à ditadura, foi sempre considerado um inimigo a ser massacrado. Logo no começo do regime militar, em 1964, de abril a novembro, foram presos, torturados e assassinados oito militantes do partido. Em 1965 foram assassinados dois militantes comunistas e em 1969, mais um. Já em 1971, os órgãos de repressão do regime consumaram a morte de três comunistas. Em 1972, foram mortos pela repressão dois militantes e logo no começo de 1973, mais um.
Mas o pior ainda estava por vir. De 1974 a 1976, a ditadura, analisando a influência do PCB na frente política e nos movimentos sociais de resistência democrática, desenvolveu a chamada “Operação Radar” para destruir o PCB, matando membros do Comitê Central (CC) e quadros importantes da vida social e cultural do Brasil: foram assassinados 21 membros do partido. Em 1977, a ditadura faz a sua última vítima no PCB ao assassinar um professor, sob tortura, nas dependências do Exército no Rio de Janeiro.
A “Operação Radar”, articulada em 1973, só entrou em funcionamento de forma mais contundente em 1974. Essa operação, iniciada em São Paulo, mudava de nome nos outros estados. Hoje, uma farta documentação comprova que o regime ao pensar a “transição segura, lenta e gradual” precisava destruir, antes, o PCB.
Essas descobertas jogam luz sobre o processo político da chamada longa transição brasileira e vai impactar os estudos sobre como se ocupou o espaço político no Brasil, e de que forma. Sabíamos das diversas operações para destruir o PCB até 1976, no entanto, essas novas fontes estão a nos mostrar que, mais uma vez, pela capacidade de reconstrução dos comunistas brasileiros – na frente democrática e nos espaços operários e sociais – o PCB, novamente, foi atacado. A repressão, com essa comprovada investida, atesta algumas questões: o partido precisava ser destruído por sua presença nas lutas sociais no Brasil, por sua longeva experiência política (1922) e por representar interesses sociais. Portanto, deveria ser infiltrado e dissecado novamente (no Brasil e no exterior). Mas não é só isso, ao atacar o inimigo número 1, os representantes da ditadura tinham uma nova justificativa para a sua existência, só que agora em outro patamar.
Âncora[1] Cientista político, professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e pesquisador da USP