Marcelo Mário de Melo lança “Os colares e as contas”

Na quarta feira 20 de junho, às 19 horas, será lançado no Museu do Estado de Pernambuco, no Recife, o livro OS COLARES E AS CONTAS – Poemas Políticos, de Marcelo Mário de Melo, que o define como a síntese poética de uma experiência política. O livro é composto de 116 poemas divididos em seis blocos: as lentes da poesia, linhas gerais, poemas anti-burocráticos, coisa de prisão, poemas verbo-visuais e pichemas.

Mesmo sem seguir uma ordem cronológica, os poemas não deixam de refletir as conjunturas políticas em que esteve envolvido o autor, que iniciou uma militância no PCB aos 17 anos de idade, em 1961, atuou na clandestinidade, migrou para o PCBR e a luta armada, cumpriu 8 anos 46 dias e 19 horas de pena como preso político em Pernambuco, de 1971 a 1979, entre a Casa de Detenção do

Recife e a Penitenciária Professor Barreto Campelo, em Itamaracá.

Após ser libertado, Marcelo atuou no PT pernambucano, em mobilizações políticas, campanhas eleitorais e articulações político-culturais. Como jornalista foi um dos fundadores da Equipe de Comunicação – Ecos, na década de 1980. Atualmente é assessor de comunicação social da Fundação Joaquim Nabuco, sediada no Recife.

Segundo seu prefaciador, Everardo Norões, a poesia de Marcelo transita entre o iconoclasta e o satírico e faz o difícil cruzamento entre ética e política. Na orelha, Pedro Américo diz que o autor é um instigador de rebeldes inquietações, com esperteza intelectual em estado de alerta, expressa com lucidez crítica e jocosa.

Do ponto de vista formal, o livro revela influências, eruditas e populares, passando por Maiacovski, Brecht, Drummond, Bandeira, João Cabral, além da presença do verso característico da literatura do cordel. A carga da imagem sobre o texto se evidencia nos poemas verbo-visuais, sugerindo aragens neo-concretas. E o poema-piada, com e sem trocadilho, se expressa nos Pichemas, onde o autor procura agregar “um toque poético” às pichações de muro, ligando poesia e graffiti e chegando ao território da agitprop: “dê voto/sem ser/ devoto; quem não/ $aca/Saqueia; ttt para todos/teto/ terra/ trabalho”

Com suas lâminas de humor poético, Marcelo crítica o que identifica como expressões políticas das classes dominantes. É o caso do poema Receita da velha raposa: “seguidas todas regras/ que sempre se alteie no céu de anil/ o manto da bandeira liberal/com letras góticas inscritas/ sobre os remendos e a tintura nova/ e após cuidado especial/ para apagar manchas de sangue”. Ou de Apresentação da gorda fome: “a fome é antiga/ e é pós-moderna/ a fome não tem/ferida na perna/a fome é robusta/e diz que é eterna”.

Num poema o autor revela uma rima presente nas nossas instituições, desde as origens: “Pedro Álvares Cabral/ colônia de Portugal/ império nacional / pessoal / regencial / república de marechal/ ditadura e general/ ato adicional/ ato institucional/ abertura gradual/ anistia parcial/ eleição colegial/ constituinte congressual/ presidência imperial/ corrupção visceral.” E ao contrário de Carlos Drummond de Andrade, afirma que basta mudar a rima em “al” para encontrar a solução dos problemas nacionais. Outros textos tocam em feridas que dizem respeito a questões hoje sob o encargo da Comissão da Verdade, como os desaparecidos políticos e a abertura dos arquivos das forças armadas.

Mas a crítica a poder não o impede de denunciar os cacoetes da militância de esquerda. Como em Perguntas incômodas: “descuidar-se ou apropriar-se /de recursos públicos/ é de esquerda? Em Anarquistas de salão: “comprimiram clamores /numa pasta/ de leve sabor apimentado/ que as elites consomem/ com torrada e caviar. Ou em Mandarins e vaga-lumes, onde investe contra os que ocupam cargos comissionados e se esquecem da mobilização popular: “a gosma oficial/ engessa o gesto/ os gabinetes filtram/ a poeira das estradas/ e instalam liturgias de opereta”.

Definindo-se como “plebeu, republicano, democrata popular, cidadão de esquerda, socialista, pluralista e seguidor do Detran – sempre à esquerda, não ultrapasse pela direita”, Marcelo dedica o seu livro aos que lutam pela abertura dos arquivos da ditadura e pela afirmação da verdade histórica; aos se mobilizam contra a fome, o raquitismo político e a subnutrição cultural; aos jovens que se rebelam contra os desníveis de renda e de mando; aos que se mantém socialistas e de esquerda depois dos 60 anos; aos proletários de todo o mundo. Nominalmente são destacados na dedicatória: Jacob Gorender, Dom Tomaz Balduíno, o Monge Marcelo Barros e Bruno Maranhão, militante do PT e do Movimento de Libertação dos Trabalhadores Sem Terra – MLST.

Há poemas dedicados a 25 militantes ou perseguidos políticos pela ditadura, passando por exilados, presos, mortos sob tortura ou desaparecidos, a exemplo de Miguel Arraes, Gregório Bezerra, Jonas Barros e Ivan Aguiar, David Capistrano, José Raymundo da Silva, Fernando Santa Cruz, Eduardo Collier, Carmen Chaves, Vera Stringuini, Lorena Araujo e Reginaldo Velozo.

Financiado pelo Funcultura estadual, com a produção executiva de Andrea Mota, o livro tem a programação visual de Gisela Abad e a capa assinada pelo autor, com ilustração de Luciano Pinheiro.