Canto ao programa do Partido Comunista do Brasil

Clóvis Moura

Poema publicado na Revista de Cultura e Política “Fundamentos”, nº 35 – Outubro 1954 – Ano VI

Não mais vejo escuro ou treva,
estrela trago na mão.
Adeus, incerteza antiga
na seara dos irmãos.
Adeus, antiga descrença,
dúvida fria, aflição,
adeus cinza, adeus angústia
na seara dos irmãos.
Não mais vejo escuro ou treva
estrela trago na mão.

Chegaste em gume e entre flores,
chegaste, arco-íris novo,
canção de berço e palavra
de pedra para o meu povo.
Chegaste em papel, lavrado
e escrito em tinta. No entanto
foste feito da certeza
do sangue que rolou tanto
que hoje é amálgama de estrela,
aço, argamassa, alavanca,
que hoje é rio e correnteza
que do sono nos arranca
que a nova primavera
de luta e rubra esperança.
E a canção outrora presa
será punho, será lança!

Não vejo, não vejo apenas
o trepidar das turbinas,
o canto dos camponeses
e o apito das usinas.
Vejo também flores, lírios
coroando céus e frontes,
casais amorosos indo
pelas encostas e montes.
Vejo os jardins, aleluias,
bocas sorrindo tão puras
que os poetas de mãos dadas
amarão com mais ternura
os bichos e as criaturas.

Certeza, só temas esta,
caminhos – só temos um.
Certeza feita de festa,
caminho de lança e rosa.

Programa do meu Partido
que embala o sono e é vigília,
que renasce em cada berço,
que é bandeira em cada mão.
Bandeira feita de brisa
que penetra o coração.
Ah, vigília, sentinela,
timão que conduz ao porto
chamado revolução.

Certeza, só temos esta,
caminhos – só temos um.

És cimitarra, és arminho,
és estrela em minha mão.
Programa do meu Partido
de granito concebido,
hoje é veio, fonte, linfa,
água, múrmura, translúcida
que canta aos homens das margens
sua mais pura canção.

Certeza, só temos esta,
caminhos – só temos um.

Oh, camponesa sem tranças:
onde está vossa beleza?
onde está vossa esperança
vencida pela tristeza?
Onde estão vossos amores,
vossa terra, vossos sonhos,
vosso noivo, vossa casa,
vosso pé de margaridas,
vossos pais, vossos amigos?

Onde está vossa esperança
de ser mãe, de ter um filho,
de beijar lábios de noivo,
de dar a seiva dos seios
a uma vida que desponta?

Tudo morreu da tristeza
despetalada no mundo…

Certeza, só temos esta,
caminhos – só temos um.

O anel que tu me deste
era vidro, se quebrou;
o amor que tu me tinhas
era pouco, se acabou.
Mas, no mar encapelado,
esta certeza ficou.
Esta certeza que é rocha
e que o mar não desmanchou.
O anel que tu me deste
era vidro, se quebrou.
Mas as letras do Programa
são lava, são viva chama:
e esta certeza ficou.

Certeza, só temos esta,
caminhos – só temos um!

Rio, fevereiro de 1954

Fonte: Biblioteca Nacional

Pesquisa e Transcrição: Lucas Silva

https://memoria.bn.gov.br/DocReader/docreader.aspx?bib=102725&pesq=&pagfis=1721