Entrevista da Dirce Machado, militante histórica de Goiás, que participou da Revolta de Formoso, na década de 1950, levante armado dos camponeses na luta pela terra, liderada por militantes do PCB. O resumo da entrevista sai agora na edição de novembro/dezembro de O Poder Popular.
Dirce Machado da Silva
A goiana Dona Dirce nasceu em 04 de setembro de 1934, atuou na Juventude Comunista e desempenhou papel central na resistência armada dos camponeses pelo direito à terra, a Revolta de Trombas e Formoso, no norte de Goiás.
Carinhosamente conhecida como Dona Dirce, nasceu em Rio Verde (GO), em 04 de setembro de 1934, filha de meeiros e rendeiros, dos quais fala com orgulho em seus relatos de vida e militância comunista.
Foi aos 12 anos de idade que Dona Dirce, em aventurança, teve contato com o livro Cavaleiro da Esperança, depois de desobedecer ordens de queimar todos os livros do PCB, cassado em 1947. O patrão, que não era comunista, tinha um primo candidato que, frequentemente, levava material do Partido para fazer finanças, material este que ficava guardado, mas tendo se tornado perigoso, coube a Dirce a difícil tarefa de destruí-lo, até descobrir o livro que a levaria para a luta política.
“Como eu aprendi a ler com o resto de livro dos outros, resto de lápis, minha mãe me ensinava, eu achei aquele o maior crime, queimar um livro era como matar uma pessoa, para mim, mas eu tinha que queimar, […] e, naquela história de queima um, queima outro, eu dei com o livro Cavaleiro da Esperança. Folheei umas folhas, achei impressionante, peguei o livro e escondi no paiol. […] comecei a ler o livro e chorar. Minha mãe me proibiu de ler, eu escondi no paiol da minha casa e escondi uma lamparina, também, e fósforo. Depois que o meu pai e minha mãe dormiam, eu levantava e ia ler até os galos cantarem, e fiquei com aquele negócio, achando que era impossível uma pessoa viver como aquele homem e o sofrimento daquele homem.” (Entrevista concedida em julho de 2014).
Através do jornal Terra Livre, que convidava a todos para comemorar o aniversário de Luiz Carlos Prestes, e entre um desmaio de emoção por saber que aquela triste história era verdadeira e a confusão criada nos dirigentes estaduais do Partido, que acreditavam estar diante de uma família militante, Dirce conhece Decliex Crispim e Colombina Baiochi, iniciando seu valoroso processo de luta pela terra.
Da militância na Juventude Comunista à atuação na capital sem se adaptar à vida urbana da época – e após aprovação partidária – mudou-se para Ceres, onde havia sido instalada a Colônia Agrícola Nacional de Goiás, em 1941, no então governo Vargas. A partir deste momento, junto ao marido, José Ribeiro da Silva, e seu irmão mais novo, César Machado da Silveira, desempenhou papel central na resistência popular conhecida como Revolta de Trombas e Formoso, no norte de Goiás.
Os Conselhos que dirigiam essa resistência eram assistidos pelo Partido, tendo sido organizado o Conselho das Mulheres, a única base feminina da região. Segundo Dirce, “nós (as mulheres) comandávamos a entrada principal da região de Trombas, tinha que passar por cima de nós para entrar em Trombas”.
Ela foi professora e parteira, juíza preparadora dos títulos eleitorais dos que residiam em Trombas, militante e dirigente, e quando a ditadura de 1964 chegou, responsável como fora preparada para ser, deixou o local para que os moradores não sofressem a violenta tortura que ela e seu marido, posteriormente, vivenciariam. Foi, também, vereadora entre 1970 e 1980 pelo MDB.
Hoje Dona Dirce relembra sua vida com o vigor de uma lutadora que nunca abandonou a luta. Recebe em sua casa aqueles que permaneceram em Trombas, oferece o aconchego que sempre quis ofertar aos mais necessitados e sempre é, merecidamente, homenageada.